Um filme dirigido por Murilo Salles com Leandra Leal.
Baseado na obra de Clarah Averbuck.

Estamos postando hoje um texto sobre a fotografia de Nome Próprio.

Fotografia como extensão do corpo, do olho do diretor. Diretor que é fotógrafo e câmera. Uma fotografia nascida da relação de intimidade entre dramaturgia, atriz e espaço.

O diretor Murilo Salles apresenta a estética de Nome Próprio, filme olho.



FILME OLHO

Nome Próprio é um filme olho.

É o resultado da esfregação do olho de uma câmera com a potência do corpo encarnado de uma atriz.

Esse filme também é a história da conjunção do Diretor com o Fotógrafo num ser. É o primeiro Longa em que Murilo Salles/diretor é também co-fotógrafo e principalmente câmera.

Nome Próprio foi feito com uma equipe pequena por opção estética, porque é um filme sobre intimidade. Qualquer ruído entre a câmera e a atriz dispersaria a energia que fluiu entre um corpo sujeito e a lente.

Camila existe nas telas, pois estava presente no corpo e na alma da Leandra, habitou um espaço ‘elaborado’ por Pedro Paulo de Souza e sua precisão temporal foi esculpida por Vânia Debs.

Nome Próprio emana uma enorme energia que foi sugada do elenco/equipe.

É um filme-câmera, no recorte dos espaços, na exposição da exuberância barroca do corpo, da captação da luz naturalista concebida com a radical coragem de ser quase nada. Luz de lâmpadas de 100 volts, 200 volts ou florescentes. A luz que esculpe uma verdade. Uma luz ética, pois prescinde da sedução do efeito, do truque do falso contraste de pedestal enterrado. O digital sem enganação. O digital que vai dominar, pois é libertário.

Libertário de um poder da técnica do Diretor de Fotografia. Que encobre suas limitações exercendo esse 'domínio'. O uso abusivo da 'ferramenta' para encobrir a falta de pensamento estético, a falta de pertinência na adequação fotográfica e principalmente a ignorância mesmo. Agora, com o Digital, o olhar está libertado para além da técnica, pois no digital tudo vira preset.

O que interessa agora é a questão da inteligência do olhar. Do saber olhar.

Nome Próprio inaugura isso radicalmente. Não é um filme ‘da luz’ é um filme ‘do olhar’. Do desejo do olhar. Do pensar como olhar. Do construir o olhar. Que destaca inclusive o 'recorte da luz', mas agora não mais como uma técnica que se impõe, pois não é o que vai fazer a diferença.

O Digital é libertário como o ato Duschampiano: nos liberta do poder do domínio de uma técnica.

Não precisamos mais do domínio do pincel para fazer ARTE. Precisamos de pensamento, de linguagem, de conceito, de história e principalmente de poética.

Na fotografia ocorre o mesmo, precisamos da inteligência no olhar ( para recortar, decupar, enquadrar) para a construção da poética da imagem. Enfim, precisamos de inteligência, não de um Dom que Deus nos deu.

Nome Próprio foi feito também porque era para ser em câmera Digital, e ele é digital na forma e no conteúdo, assim procura sua coerência estética e formal.

SOBRE A FOTOGRAFIA do FILME
Texto escrito em 25/01/2006 para ser trabalhado com Fernanda Riscali / Diretora de Fotografia


Hoje não tenho a menor idéia de como é a fotografia que esse filme precisa. Temos que procurá-la, temos que encontrá-la. Ela será resultante dessa busca e das realidades que formos encontrando.

Fizemos uma OPÇÃO RADICAL: a via digital do filme. Isso tem a ver com o assunto do filme, o mundo virtual, a escrita via internet, o blog de Camila, e aí, na base disso tudo, o pixel. A estrutura do ASSUNTO está na base de nossa captação: o dígito. O zero e o um. A passagem da luz e a opacidade.

Essa opção vai influenciar/determinar completamente o trabalho de criação das imagens: sim, no UHR, estamos mais próximos de uma nova imagem, de uma imagem de constituição pixial, não granular. Uma questão nova.

A cor no pixel é o registro de três valores de brilho, um para cada cor primária: RGB. Não adianta tentarmos "aplicar" conceitos fotográficos/cinematográficos pois eles não irão funcionar da mesma maneira, apesar de podermos falar de brilho, contraste, iluminação, latitude, grão... e cor. Mas com um NOVO PENSAMENTO. Temos que aprender a pensar essa nova concepção pictórica. Pois, na fotografia digital vamos procurar "o que brota dessa nova base". Trabalhar o específico do digital ainda com compressão. SIM, porque estaremos trabalhando/gravando imagens com uma compressão 4:2:2 e projetando em 4:2:0. Não estaremos trabalhando com 2.2 milhões de pixels em nosso CCD (Alta Definição) com 1.920 linhas por 1080. Estaremos trabalhando no mundo muito menos definido e com menos informação de cor (720p). Não adianta querer brigar contra isso: é isso e vamos nessa, procurar uma imagem inteligente e pertinente nesse formato.

Nosso filme será um filme de câmera/um filme de olhar.

Portanto precisamos apurar a inteligência/sensibilidade do nosso OLHAR.

O conceito de "Cinema-Poesia" de Pasolini, eu substituiria aqui por "olhar-poesia" mantendo o rigor de percebermos o tempo todo que existe uma câmera como posicionamento estético.

PREVILEGIAR a relação de intimidade da câmera com CAMILA.

Esses são nossos CONCEITOS, nossos OBJETIVOS. Narrar com a câmera, uma imagem silenciosa que tenta desvendar os mistérios de Camila .

Existe um OLHAR FEMININO? O que é isso? Enquadramento, fotografia? Como criar uma "subjetividade feminina" na imagem? Como a câmera vai "exalar" um estamento feminino com seu olhar para as coisas e para a realidade?

COMO CONSEGUIR ISSO?

Essa é a nossa questão. E você como MULHER tem que me ajudar MUITO a pensar isso tudo. Esse é um primeiro "menu" de questões que temos que pensar e tentar responder, pesquisar, adormecer com elas, sonhá-las e resolvê-las.

Acho que o CONCEITO FOTOGRÁFICO vai surgir na junção de dois fatores:

1- A câmera que vamos usar; e, 2- As locações que serão escolhidas.

- Quando tivermos esses dois fatores 'sobre controle', vamos passar para uma fase experimental: gravar as locações com a câmera e ver como reagem a luz existente, de dia e à noite em todas suas sutis variações.

- Depois desse check-up, vamos decidir o que PODEMOS e o que DEVEMOS fazer.

- Nessa experimentação é que vamos DESCOBRIR o estilo visual e fotográfico do filme UHR.

Acho que do "paper" de PRODUÇÃO podemos tirar as seguintes questões:

1- Estudar um conceito de luz para cada locação - interior / exterior / dia / noite.
2- Resolver o problema de correção de cor quando misturarmos Luz Daylight com Lâmpadas Incandescentes (2.800K) na filmagem.
3- Criação, desenvolvimento e construção das "luzes", das traquitanas, e das "luminárias" auxiliares para a fotografia do filme.
4- Estudar qual a melhor e mais fácil traquitana para colocar a câmera pendurada no teto de ponta-cabeça.
5- Outra coisa IMPORTANTE E URGENTE PARA IRMOS PENSQUISANDO: qual o tamanho da nossa equipe? Quem são?: de elétrico, de movimento e o ajudante para os dois.

2 comentários:

Anônimo disse...

Se não se incomodar com críticas, leia abaixo:

Sobre a atuação da Leandra Leal:

Fudida!

Sobre a fotografia:

Assisti a pré-estréia ontem no unibanco arteflex. Ainda estou engatinhando em fotografia, mas queria perguntar umas coisas pra ti, Fernanda:
O problema de misturar daylight com incandescente ou estas com tugestênio, oq vc fez? Lembrei agora só de uma cena no banheiro onde a "camila" é vista pela câmera, a qual está na sala. Então notei a sala amarelona ( tugestenio) e o banheiro mais corrigido ( ainda assim meio branco) Oq vc optou ali?



gostei de alguns planos meio vouyeristicos acho que casa bem com toda exposição que a protagonista se expõe.

Não gostei de alguns travelings feitos em cima da geringonça que eleva a câmera. Principalmente um que rotaciona esta no próprio eixo, é nauseante. Qual a intenção deles além de variar as possibilidades de planos?

sobre a arte: hum por mais realístico que fosse n gostei da locação do apartamento. Por mais realisticos que fossem, era muito feio :( .

ps: Se n for atrevimento meu, qual o orçamento do filme?

Anônimo disse...

Marcelo,
Apenas misturamos as temperatura de cores!
Usamos o pré-sets da câmera mesmo.
Decidia-se em cada situação se usaríamos o pré-set Daylight ou 3.200ºK.
Na sala usávamos lâmpadas incandescentes comuns de 100 / 200 / 300 watts. e no banheiro usávamos luz florescente daylight comum, tanto com na cozinha. Na cozinha, revestíamos uma das florescentes (eram duas) com uma gelatina verde, para esverdear um pouco o ambiente. Mas a "operação de iluminação" era bem básica, sendo a mais realista possível. Por exemplo, no segundo apartamento de Camila, que era bem iluminado, em 90% das situações filmamos com "luz existente"!
Nossa opção era "regular" bem a exposição. Raramente usamos "refletores" como os normais de qualquer Longa Metragem. Usamos muito lâmpadas comuns.
Sobre a arte ela me parece absolutamente precisa e linda no seu conceito e propósito.
Sobre o orçamento: R$ 1.200.000,00
VALEU o comment e desculpa pelo atraso da resposta. Estávamos viajando à trabalho.

Músicas de Camila