Um filme dirigido por Murilo Salles com Leandra Leal.
Baseado na obra de Clarah Averbuck.

Jornal do Comércio -Critica de Hélio Nascimento, 29/8/2008.


Fragilidades

O novo longa-metragem de Murilo Salles, filmado e exibido na forma digital, confirma que o cineasta merece ser incluído no grupo de realizadores brasileiros dignos de toda a atenção. Ele tem voz própria, não segue correntes e pratica um cinema urbano, voltado para setores da classe média para cima. Mesmo que a partir de segundo filme não tenha realizado obra tão admirável como Nunca Fomos Tão Felizes, o notável opus um de sua filmografia, ele nunca deixou de ser um autor de filmes e não um mero encenador. Filmes como Faca de Dois Gumes e Como Nascem os Anjos, assim como primeiro, também exibidos - e injustiçados - no Festival de Gramado, são trabalhos de nível bem superior à média de nosso cinema, reveladores de um processo investigativo que evidencia que os males de uma sociedade não devem ser limitados ao método que escolhe a miséria exposta como o único caminho. De certa forma, sem significar que o cinema de Murilo Salles seja um descendente deles, o cineasta de Nome Próprio prolonga o cinema de realizadores como Walter Hugo Khouri e Arnaldo Jabor, na medida em que escolhe um universo distanciado das palavras de ordem e do discurso. Murilo prefere alcançar o espectador acompanhando a trajetória de seus personagens, pois nela vê os sinais reveladores, os sintomas de desajustes, a evidência de fragilidades emocionais.
Nome Próprio, o novo filme do diretor, desta vez vencedor do Festival de Gramado, reafirma a preferência do realizador por personagens que, vivenciando uma solidão quase insuportável, procuram uma afirmação pela busca de ligações humanas que os salvem do desastre. O filme é obra de um verdadeiro autor. Só o desconhecimento ou a falta de memória poderia permitir que não fosse visto no filme de agora um prolongamento de Nunca Fomos Tão Felizes. Aqui, outra vez o cenário do apartamento vazio, na segunda metade da narrativa, expressa essa solidão. Eis um ponto de ligação que merece ser melhor explorado pelo observador. Uma crítica que poderia ser feita ao filme é a de que ele não aborda a relação da protagonista com sua família. Mas essa crítica não seria justa, pois esquece que um filme se insere numa filmografia, numa obra maior, faz parte de um discurso mais extenso. No filme de estréia, o filho deixado num apartamento vazio pelo pai envolvido em luta política expressava a dor do abandono e da solidão, tema que voltaria depois a ser expresso em Faca de Dois Gumes, sem esquecer que duas crianças são de certa maneira vítimas em Como Nascem os Anjos. Assim, se não vemos em Nome Próprio a infância da protagonista, se as figuras dos pais estão ausentes, tal carência é explicitada nos filmes anteriores e, de certa forma, é repetida aqui no plano em que o pai de um dos jovens com que Camila se relaciona praticamente a expulsa de casa. É uma cena rápida, ocupa poucos minutos da narrativa, mas é suficiente para tornar claras as causas de todas aquelas fragilidades emocionais da protagonista, como se o diretor estivesse recorrendo a uma volta ao passado.
Eis aqui outro tema importante do filme e que aparece pela primeira vez na obra do cineasta. A personagem principal praticamente não se afasta de seu computador. É através dele que busca alcançar a bóia salvadora ou a âncora que lhe permita algum tipo de estabilidade. É quando o contraste surge de maneira bem clara, quando as imagens e as situações do filme colocam em cena a incômoda verdade que constata ser o progresso tecnológico inversamente proporcional ao aperfeiçoamento emocional dos indivíduos. Quando, numa de suas melhores cenas, o filme mostra a personagem procurando colocar ordem no seu cenário, em luta inútil contra o caos que a cerca, fica exposta toda a intensidade desse drama que flagra a protagonista tentando recuperar o perdido, procurando voltar a um mundo do qual foi expulsa. O filme procura flagrar o ser humano na luta para recuperar a harmonia desfeita. A variação proposta pelo cineasta em torno do tema da incomunicabilidade merece ser conhecida. No painel que sempre deve ser uma cinematografia a presença de um filme como Nome Próprio não deve passar despercebida.

6 comentários:

David Cejkinski disse...

até que em fim uma boa critica! aleluia!!!

Maria Clara Spinelli disse...

tem uma crítica do Paulo Santos Lima do filme, que meu amigo me enviou. vocês já leram? posso mandar por e-mail se quiserem. o meu é m.clara.s@gmail.com beijos!

Luiza Rudge Zanoni disse...

Avante, diretor!
Beijo, VS.

Anônimo disse...

Sei que não é tão importante para este filme conceitual, a questão da bilheteria, mas alguém sabe o estimado até agora?

Anônimo disse...

Já lemos a crítica do Paulo sim, Maria Clara. Obrigado.

Léo Bittencourt.

Anônimo disse...

Nossa, estou louca para ver esse filme nas telas dos cinemas aqui de Belo Horizonte - MG. Será um grande sucesso!!


Um abraço e é isso aí!!!

Músicas de Camila